Extração de ouro traz riscos para a população e patrimônio de São João del-Rei

     A mineração e o comércio, principais fatores de povoamento das cidades históricas de Minas Gerais no século XVIII, deixaram marcas no ambiente natural e cultural de São João del-rei. No centro da cidade se avista o conjunto arquitetônico colonial de casas, museus e igrejas barrocas adornadas, mas também são vistas as betas, profundas perfurações que se faz nas pedras para perseguir os veios de ouro. Essas betas, concentradas na região que se denomina tanque, ainda hoje são alvos de explorações. Explosivos e outras técnicas utilizadas na extração do ouro colocam em risco as casas históricas em torno e também a população local e os próprios garimpeiros.
A ocupação de São João teve início ainda no século XVII, quando bandeirantes paulistas, nas buscas pelo ouro, passavam pelo Caminho do Sertão, depois conhecido como Caminho Velho. Até o final do século XVIII a mineração constituiu a principal atividade econômica da cidade e região. A exploração aurífera nas encostas da Serra do Lenheiro estabeleceu o núcleo povoador de São João del-Rei e, por isso, observamos grandes betas sempre em direção a esses morros.
O canal dos ingleses, construído no século XVIII, vai desde o Córrego do Lenheiro, passando pelo Morro das Mercês e chegando na região do tanque, onde eram feitas as lavagens do ouro. O historiador Roberto Maldos explica que o ouro vem misturado ao cascalho e por isso era necessário separá-lo em tanques de água: “Toda a região ocupada aos redores da igreja do Carmo eram áreas de sedimentação, de lavagem de ouro, tanto que as casas ali são construções mais recentes, datam de aproximadamente 1850, devido à direção que a exploração tomava”.
Ao invés da exploração aurífera prosseguir em direção aos morros, começou-se a perfurar betas cada vez mais profundas, subterrâneas, em direção ao centro histórico da cidade. Roberto Boscolo, auxiliar institucional do Museu Regional de São João del-Rei, explica que, mesmo após a proibição da extração de ouro, há aproximadamente 10 anos atrás, ainda existem pessoas na atividade. “Na igreja do Carmo existe uma trinca enorme causada pelos abalos de dinamites do C.D. em betas na região do tanque”, comenta Roberto.
Casas no bairro São Geraldo sofrem constantes danificações nas suas estruturas, como trincas e rachaduras. Na região do tanque, moradores convivem com bichos peçonhentos que encontram abrigo nas betas. O ex-morador do local, Francisco de Guadalupe conta que já morreram muitas pessoas na extração do ouro: “Lembro que nos anos 1990, seis jovens garimpeiros de São Gonçalo do Amarante, que trabalhavam nas betas furando pedras para colocar dinamites, morreram com areia no pulmão, devido ao pó das explosões”.
Joviano Bem, morador do tanque e ex-garimpeiro conta que a rua Marconde Neves foi aberta pela própria atividade mineradora. “Os dois morros, em ambos os lados da rua se encontravam, mas devido às explorações abriram esse terreno que a prefeitura de São João aforou para a população carente”, diz Joviano.                       
      O aforamento da área é outro fator preocupante, pois a região possui muitos veios de água e minas, prova é que o Damae instalou uma bomba de água no local para abastecer a cidade. As casas são muito úmidas e o fundo delas dão para enormes betas abertas, que trazem mofos, podem ocasionar doenças respiratórias, escorpiões e riscos de desmoronamento para aventureiros que continuam na exploração indevida das betas.
Outra questão é que as perfurações profundas atingem o lençol freático, podendo contaminar a água de qualidade que existe na região do tanque. Ao caminhar pela rua Marconde Neves é possível ver a água que perfurou o asfalto e mina do solo encharcando a rua.
Segundo Joviano Bem, em 2002 houve uma intervenção Federal que proibiu a extração de ouro no local, principalmente por causa do uso de dinamites. Mas como não existe uma fiscalização recorrente, novas técnicas estão sendo empregadas, clandestinamente para extrair ouro. “A beta do C.D. já pode ser considerada uma mineradora, pois tem aproximadamente 120m de profundidade. E sabemos que é um negócio rentável, eu mesmo tirava 25 gramas de ouro por semana”, conclui Joviano.
    
      Reportagem e fotos: Mariana Fernandes.
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